quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Quando o anjo me ensinou


Desci uma ladeira de quase um quilômetro para encontrá-lo.
Num carro, se não me engano azul. Sim, azul, com alguns homens e entre eles, o de cabelos longos e loiros, com o braço para fora da janela. Másculo, viril, com aquela pose e o braço tatuado para fora da janela.
Eu, descendo a rua principal.
Com nome de anjo e tatuagens de demônios. Ele era um menino grande.
Voz anazalada, dentes mau tratados, pura cocaína por entre as gengivas.

Dia desses lembrei de seu sorriso tímido. Seus cabelos longos e soltos naquela noite. Sim, única vez que eu o vira assim. Decerto por querer impressionar-me. Cabelos brilhantes, cheirosos, lisos e loiros. Camiseta de cor única, jeans e sapatos. Camiseta sem perfume, mas com cheiro suave do amaciante misturado ao odor da pele.
Dedos longos, mãos pesadas, braços marcados... toque suave.
O anjo e o demônio.

Noite de festa, cidade toda se encontrando na casa mais tradicional do lugarejo.
Olhavam-se todos entre si, estranhamente. Uma doce menina, desdenhada quando da companhia do menino grande. Quem o conhecia? Quem sabia dele, da sua história feliz ou triste?
Eu sabia, não somente de seus cabelos loiros e seus braços tatuados, mas de sua essência, de seu pai morto e da falta que ele lhe fizera. De seu irmão especial, com o rosto semelhante ao seu, quase idêntico, não fosse os cabelos negros.

Eu sabia de sua poesia, de suas letras recitadas do nada e de sua mania de querer levar minhas sardas consigo. “Pô mina, eu te amo”. Primeira vez que ouvira algo assim: tão puro, tão alto e em bom tom. Dois braços abertos imitando Cristo na cruz e gritando seu sentimento.
O abraço, o cheiro da camiseta, o sorriso de canto de boca, a coisa mais pura que já senti.
Um anjo e um demônio, num só.

Sem compaixão, em seu ato de coragem e nobreza, o fizeram morto brutalmente.
O anjo partira. Subiu aos céus, hora de encontrar seu pai e de brincar de desenhos de flores com os anjos pequenos. Hora de eu o ter para sempre.
Meu demônio virou anjo e me ensinou o que é o amor.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Empoeirado...

... se mostra o mundo,
Ao nos determos para morrer;
Queremos, então, o orvalho -
As homenagens têm sabor seco.

O pendões afligem um rosto agonizante,
Porém o mais prosaico leque,
Movido por mão amiga,
Feito chuva nos refresca.

Que minha seja a missão,
Quando tua sede chegar,
De trazer os bálsamos de Hybla
E os rocios da Tessália.

Emily Dickinson

sábado, 8 de novembro de 2008

Equação da dor

O amor é exato.
Sou o resto
de um cálculo perfeito,
a incógnita que ama
mas que não serve em tua vida
este gráfico inconstante
Mas por que
Estou em seu domínio
Se não sou a tua imagem?

Poema do meu grande amigo Everton Santos

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Quente, viva: uma cor


Nunca gostei da cor vermelha. Pelo menos para vestir. Acessórios sim, tipo tênis all star, cintos, alguma regata sob uma jaqueta jeans... Tinha pra mim que era uma cor vulgar.

Leoninos são apaixonados. Leão, signo do fogo. Fogo vermelho, chamas ardentes.
De manhã, em pleno finalzinho de outubro, o céu estava vermelho. Nuvens aradas pelo vento. Impressão que dava era que queimaríamos os pés se passássemos descalços por elas.

Vermelho.
Cor da paixão. Cor viva, reluzente, forte. Dia desses me falaram do pôr do sol. Imaginei-o avermelhado. Imediatamente lembrei dele hoje pela amanhã. Apesar de não tê-lo visto. Os detalhes avermelhados da natureza me chamaram a atenção em todas as andanças que fiz hoje cedo.

Por um momento, o sol apareceu, limpo detrás dos morros. Refletiu nos meus cabelos, vermelhos também.
Meu casaco de veludo refletia no retrovisor do carro, misturado com as nuvens, ainda aradas. Tão lindas terras imaginárias, lavradas por animais imaginários. Iguais às tardes que eu via meu avô lavrar a terra que preparava para o plantio de aipim. O calor daquele vermelho me tomou.

Associei o crepúsculo da manhã à mensagem no celular, falando do pôr do sol visto de uma janela no finalzinho de um domingo, meu casaco de veludo vermelho, fios reluzentes dos meus cabelos refletidos no espelho ao meu estado de espírito, às vontades e as saudades...
É, acho que gosto de vermelho. Cor viva, cor quente, cor da paixão!

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

É o que tenho para ti



Não te deixarei nenhuma fortuna
Não tenho anéis de brilhantes ou colares de pérolas

Não tenho casa em meu nome, nem mesmo um automóvel quitado

Não tenho roupas de marcas famosas


Posso te deixar um mundo de sorrisos e de abraços apertados

Deixo-te meu amor infinito e nem vais precisar de procuração para tomares posse

Ele é todo teu

Minhas mãos em tuas bochechas

E meus lábios finos a beijá-las: lembranças


Não tenho conta bancária recheada de reais

Tampouco dólares ou euros, que nem sei qual a cotação hoje

Não faz diferença do quanto juntei nesta vida

Vivi pouco até aqui para juntar algo

Mesmo assim, meu mundo é teu


Marquei meu corpo com teu nome e dele não sairá mais

Tenho meu exemplo de honestidade para te deixar

Minha honradez

Não siga os meu erros

Tu vais errar também, mas não repita os meus


És inteligente o suficiente para não cometê-los

Lute como uma guerreira e ame como uma santa

Não te arrependas de seus erros, mas evite cometê-los

Penses duas, três, mil vezes antes de agires

Dou a ti meu amor eterno

Entrego a ti minha alma


Olhes para nosso amor e o tenha como base para tua luta

A vida é de luta

Mas se colhe bons frutos

Alguns azedos, outros extremamente doces

Não reclames de nada

Sigas em frente e proves para si mesma a capacidade que tens

Não proves para mais ninguém, somente a ti mesma


Sejas honesta consigo e serás honesta com o mundo

Amo-te mais que a mim mesma

Sigas teu coração em plenitude

E se quiseres seguir alguns de meus passos

Que sigas os que eu acertei

Os passos em falso, que te sirvas de lição sem ter que tomá-las para si


É isto que te deixo, minha querida Laura.

Um amor incondicional

Um amor que só vi uma vez nesta vida: o de minha mãe para comigo

E este amor, estendo a ti

À minha filha, com todo amor do mundo